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O DESAFETO

Expulsão de tribuna de honra de São Januário marca rompimento com Roberto Dinamite

Maior ídolo da história vascaína derrotaria corrente ligada a Eurico anos depois.

Antônio Divino

23 de junho de 2021

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Versão colorida da foto histórica de Eurico com Roberto Dinamite. Foto: Twitter Vascomunistas

Dinamite fala sobre expulsão da tribuna de honra de São Januário. Vídeo: Globo

Roberto Dinamite relembra sua relação com Eurico. Vídeo: UOL

estreia de Vasco da Gama e Ponte Preta na Taça Rio-São Paulo, em janeiro de 2002, terminou em empate por três a três. A partida foi disputada, mas a principal notícia da noite não esteve dentro das quatro linhas. O tradicional torneio, que se encerraria naquele ano com domínio dos paulistas, marcaria também o rompimento de duas figuras icônicas do Vasco. Eurico Miranda ordenou a expulsão de Roberto Dinamite da tribuna de honra do estádio de São Januário, iniciando uma briga que jamais seria resolvida.

 

Dinamite foi ao estádio com seu filho e um grupo de amigos assistir à partida nas cadeiras como estava acostumado. Chegando lá, foi convidado por Antônio Calçada - presidente de honra do Vasco – a ingressar à tribuna de honra. Foi quando um dos momentos mais constrangedores na vida de Roberto Dinamite aconteceu.

 

No intervalo da partida, o diretor da tribuna pediu para que Roberto e seu filho se retirassem do local. Sem entender o que estava acontecendo, Dinamite perguntou o motivo. A resposta foi seca: “Ordens do presidente”.

 

Tudo começou quando Dinamite criticou publicamente a postura do então Presidente Eurico em aposentar a camisa 11 no Vasco da Gama, em homenagem a Romário. O tempo passou, mas Eurico não digeriu bem a opinião de Roberto.

 

A partir daquele momento a relação Eurico-Dinamite estava abalada para sempre. Roberto deu entrevistas na época, chegando a chorar, expondo sua indignação pelo ocorrido: “É duro pra mim, na minha casa... onde eu iniciei, vivi... ser tratado dessa forma”.

 

A notícia repercutiu. A rixa entre dois nomes fortes do Vasco ofuscou a grande partida de abertura da temporada, em São Januário. A torcida se mostrou ao lado de Roberto. Muitos pediam respeito ao ídolo vascaíno nos telejornais. “Tinha que expulsar era o Eurico Miranda, não o Roberto” disse um torcedor na época.

 

O futuro reservava mais conflitos entre os dois. Iniciava-se assim a derrocada de Eurico Miranda e a ascensão de Roberto Dinamite, que nos braços da torcida, seria ungido à presidência do clube que o formou.

Após a expulsão da tribuna, Roberto Dinamite, com o apoio do MUV (Movimento Unido Vascaíno, criado em oposição aos abusos de Eurico Miranda), foi derrotado em duas eleições cercadas de polêmica e com acusações de fraude.

 

Na época, até os sócios já falecidos votaram no então presidente. Porém, a segunda eleição, em 2006, teve tantas irregularidades e abusos que acabou sendo anulada pela justiça e remarcada para 2008.

 

No dia 21 de junho de 2008, a chapa pró-Dinamite venceu as eleições para formação do Conselho Deliberativo do Vasco. Eurico Miranda decidiu não participar do novo pleito.

 

Na madrugada de 28 de junho de 2008, com participação de vascaínos ilustres antes afastados do clube - Eurico não dava título de sócio pros jogadores. Justamente para eles não entrarem na política- e apoio maciço da torcida, o conselho deliberativo elegeu Roberto o novo presidente do clube.

 

Como presidente do Vasco, Roberto Dinamite não conseguiu sequer imitar o sucesso que teve como jogador. Logo no primeiro ano de governo, o Vasco da Gama foi rebaixado pela primeira vez no Campeonato Brasileiro.

 

Eurico Miranda não deixou barato, e as críticas à administração de Roberto eram comuns: "Tenho de dar parabéns ao Roberto e companhia por essa desgraça que aconteceu ao clube. Não tenho mais o que falar, pois os erros já foram apontados. É o pior dia da história do Vasco. Nada é pior que isso", afirmou Eurico.

 

Subiu de volta para a Série A conquistando o título no ano seguinte. A partir daí, o clube manteve campanhas irregulares e conquistou apenas a Copa do Brasil em 2011.

 

Em 2013, o Vasco caiu novamente para a Série B, excluindo de vez a possibilidade de o Presidente tentar o terceiro mandato no ano seguinte.

 

 O pleito vascaíno foi marcado para o dia 06 de agosto, mas devido a várias denúncias sobre um possível esquema de compra de votos, envolvendo o candidato Eurico Miranda, a eleição foi adiada, na Justiça, para 11 de novembro.

 

Sendo assim, Conselheiros do Clube elegeram uma comissão para assumir o comando, pondo fim ao mandato de Roberto Dinamite, que dias depois, sob efeito de uma liminar, conseguiu o direito de permanecer na presidência até a data do novo pleito.

 

Em 2015, Eurico Miranda volta a presidência do Vasco da Gama. Ganha o campeonato estadual no início do ano, dando esperanças para a torcida que os rebaixamentos anteriores ficariam no passado. “O respeito voltou” dizia o entusiasmado Eurico.

 

O ano se passou e a campanha do Vasco foi pífia no Brasileirão. Eurico mantinha a pose, não deixava a peteca cair. Dizia que o time não cairia em hipótese alguma. Que se mudaria para Sibéria caso acontecesse.

 

Porém, no dia 6 de dezembro de 2015, o Vasco caiu para Série B pela terceira vez em oito anos. Mas para quem achava que Eurico finalmente assumiria a culpa dos seus erros, se enganou.

 

“Eu encontrei o Vasco, no quadro de terra arrasada. Eu encontrei uma situação de imediato, que esse cidadão que passou aqui, chamado Roberto Dinamite, passou sete anos no Vasco, e não recolheu um centavo de imposto, um centavo de fundo de garantia, e me deixou com três meses de atraso de salário.” Justificou Eurico em entrevista coletiva, um dia após a queda.

 

Quem poderia imaginar, que uma relação de dois nomes muito importantes da história do Vasco, poderia se desgastar tanto ao longo dos anos. Eurico Miranda e Roberto Dinamite tem suas histórias entrelaçadas desde a década de 80.

Dinamite em coletiva na época em que presidia o Vasco. Foto: Vasco da Gama

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Impressões de Dinamite

Muitos dizem que Eurico foi o grande responsável pela volta de Roberto ao Vasco. Perguntado sobre o assunto, Dinamite se mostrou impaciente ao falar sobre Eurico Miranda. Mostrando ainda ter mágoas com o ex-presidente

 

- Eurico é passado, não tenho nada pra falar sobre Eurico. Eu voltei para o Vasco porque eu quis voltar. Ele não teve nada a ver com isso. – Exclamou Dinamite desligando a ligação.

 

Um grande personagem do nosso futebol, Márcio Braga, ex-presidente do Flamengo, na época de ouro do clube, também foi protagonista nessa história, e corroborou com Dinamite, dizendo quem foi o maior responsável pela contratação.

 

Márcio disse que Eurico Miranda, mesmo tendo recebido muito crédito pela contratação, não foi o principal articulador da repatriação de Dinamite, e sim Antônio Soares Calçada.

A repatriação de um ídolo

ano era 1980 e Dinamite estava infeliz no Barcelona, depois de grande sucesso e idolatria no Vasco da Gama. O clube catalão contratou o ídolo com pompa de craque, mas o atacante nunca vingou na Europa.

 

Sem muitos minutos em campo e com saudades de casa, onde era ídolo, Dinamite quase foi contratado pelo maior rival do Vasco, o Flamengo. Márcio Braga, presidente do rubro-negro na época, rumou para Espanha com a certeza da contratação de um dos maiores ídolos do clube rival.

 

- Quando eu saí daqui para contratar o Roberto, lá na Espanha, em Barcelona... Ele tava mal lá, tinha sido vendido pelo Vasco e não estava bem, e recebemos esse aviso. Só saí daqui na hora que garantimos a contratação do Nunes (atacante supercampeão pelo Flamengo) que estava no México. O Nunes uma vez contratado, nesse mesmo dia eu peguei o avião e parti para Espanha para contratar o Roberto. – Relembrou Márcio Braga, em entrevista exclusiva para nossa matéria – Quem nos deu a informação sobre o Roberto foi o Almirante Heleno Nunes, então Presidente da CBD.

 

Márcio então rumou a Europa na expectativa de fazer essa grande contratação que pararia o Brasil.

 

- A verdade é que nós não tínhamos um tostão. O problema era esse. Como sempre era tudo “bla bla bla” mas grana mesmo, o Flamengo não tinha e nem nunca teve. No dia que chegamos, teve um jogo do Barcelona no Camp Nou. Me botaram para sentar na tribuna de honra com aqueles homens importantes, assistem ao jogo de paletó e gravata, fumando charuto. Fiquei muito impressionado. Depois veio falar comigo o Vice de Finanças do Barcelona, chamado Juan Gaspar. Tivemos uma conversa com ele, mas não tínhamos dinheiro. - Afirmou Márcio, rindo da situação

 

-Sabíamos que o Roberto estava mal porque havia sido substituído ainda no primeiro tempo na partida que assistimos. Ele tava triste, aqui ele era um líder, lá ele não era nada. A conversa foi, voltou, mas não chegamos a um acordo. No dia seguinte íamos embora, mas no aeroporto quem nos esperava? Juan Gaspar com a secretária e com a máquina de escrever, querendo fazer um pré-contrato, uma promessa de venda do atleta, por 700 mil dólares. Aí veio a famosa pergunta da TV Globo: “Como vocês vão pagar pelo atleta?” Falei: “Da mesma forma que o Barcelona pagou ao Vasco.” O Barcelona não tinha pagado ao Vasco da Gama, então por que eu vou pagar? Isso explodiu aqui no Brasil como uma notícia bombástica.

 

Com a repercussão da notícia, o Vasco da Gama entrou na negociação, Márcio relembra.

 

- O Vasco da Gama entrou com a sua força comercial. Com ajuda daquele grande empresário, Olavo Monteiro de Carvalho, e ainda com o fator do Barcelona dever dinheiro para eles, o que contribuiu para contratação. Olavo mandou o Eurico para Barcelona e fecharam a contratação. Entraram em um acordo com os espanhóis e pagaram uma parcela.

 

Acabou que ambos os clubes saíram ganhando dessa situação. O Flamengo não conseguiu contratar Roberto, mas ali era o início dos maiores anos da história do rubro-negro. Campeão Brasileiro, da Libertadores e do Mundial de Clubes, nunca saberemos o que seria desse time caso Dinamite fosse contratado.

 

Por outro lado, o Vasco conseguiu dar um balão no seu maior rival e trazer o seu maior ídolo de volta para casa, sendo campeão carioca e finalista do campeonato brasileiro. Além de Dinamite se sagrar o maior artilheiro de todos os tempos do Brasileirão, selando de uma vez por todas seu nome na história do Vasco da Gama.

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O Campeonato Brasileiro de 1987

Outra grande polêmica que cruzou a história de dois dos grandes personagens do futebol brasileiro: Eurico Miranda e Márcio Braga, foi o Campeonato Brasileiro de 1987. Eurico Miranda deu declarações na época dizendo que o legítimo campeão era o Flamengo. Em 2015, em uma entrevista para ESPN, ele mudou de ideia, dizendo que as imagens da época eram montagens.

 

 Perguntado sobre Eurico e suas declarações sobre o Campeonato Brasileiro de 1987, Márcio comentou sobre a folclórica figura e essa situação.

 

- O Eurico lá no Vasco foi realmente muito importante. Ou as pessoas amam o Eurico ou o odeiam, oito ou oitenta. É uma personalidade controversa. Mas sobre essa história de 87, quando discutimos no Clube dos 13 sobre o cruzamento, foi unânime. Agora, ele querer dizer uma coisa e depois dizer outra... É isso aí, o Eurico é isso aí. Já foi, que Deus o tenha... Ele era um mentiroso contumaz. Um malandro inteligente, mas também de honesto não tinha nada. Se o Vasco está quebrado é graças ao Eurico.

Flamengo comemora o título da Copa União de 1987. Foto: Guilherme Pinto/ Agência O Globo

O clássico do Rio de Janeiro

Márcio tem um carinho especial pelo Vasco. Fala sobre o cruzmaltino de forma diferente. Para ele, o maior rival do Flamengo. 

 

- Eu sempre defendo o Vasco. Eu torço pelo Vasco porque ele é o melhor cliente pro Flamengo. Se não fosse o Vasco como eu ia pagar as nossas contas? Fluminense e Botafogo não tem torcida. O Vasco bota gente no estádio, é um jogo diferente. Eurico foi um dos responsáveis dessa inflamação toda. Mas é isso, a gente ganha, eles são vice e a gente campeão. Ganhamos tanto do Eurico até perder a fala, o fôlego. O Eurico era bom por isso, discutia, gritava, xingava e perdia o jogo.

 

Por onde passou, Eurico sempre deixou sua marca, seja positiva ou negativa. Não há dúvidas que é um dos maiores nomes do futebol brasileiro. Entre conquistas e fracassos, fato é que figuras folclóricas como Eurico Miranda e Márcio Braga fazem falta nos dias atuais.  

 

"O Eurico não é o problema. Aliás ele é bom para o Flamengo, pois é o melhor adversário do Flamengo. Com quem fazemos o clássico dos milhões? Não é com o Vasco? Então o Vasco forte é bom para o Flamengo. Ele foi lá sem time, sem dinheiro e ganhou o campeonato. Mas o bom é que eles pagam a conta quando enchem os estádios. Então, é bom tê-los fortes novamente e o Eurico faz isso" – Marcio Braga em entrevista para o Globoesporte.com, em 2015.

Euriquinho, filho de Eurico Miranda, foi procurado pela reportagem, mas não quis dar entrevista.

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Zico e Roberto Dinamite no Clássico dos Milhões. Foto: Clóvis Ribeiro

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